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SAÚDE

Estudo encontra carga mais alta de coronavírus em crianças pequenas do que em adultos

Pesquisa publicada no JAMA Pediatrics com amostras de 145 pacientes infectados encontrou maior indicativo de carga viral em crianças

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Publicado: 31/07/2020 às 16h16min

Criança fotograda em Medan, Indonésia; autores de pesquisa no JAMA Pediatrics destacam que saber sobre potencial de transmissão das crianças é ainda mais importante com planos de volta às aulas e de uma eventual vacina
Foto: EPA/DEDI SINUHAJI / BBC News Brasil

Um novo estudo, publicado nesta quinta-feira (30) no periódico JAMA Pediatrics, dá mais uma pista sobre aquela que tem sido uma das principais incógnitas da pandemia de coronavírus: qual é o papel das crianças na transmissão da doença?

Segundo os autores do trabalho, do Hospital Infantil Ann & Robert H. Lurie de Chicago, nos Estados Unidos, quando doentes, elas têm uma carga viral considerável que, a ser confirmado por novos estudos, pode significar uma capacidade relevante de transmitir a covid-19.

Isto porque testes moleculares (PCR) encontraram em crianças doentes com menos de cinco anos mais fragmentos do material genético do vírus — mas não o vírus “inteiro”, é importante destacar — do que em crianças com 5 a 17 anos ou mesmo adultos.

Os pesquisadores do hospital americano reuniram amostras, retiradas do nariz, de 145 pacientes com covid-19 confirmada por PCR, com sintomas leves a moderados e no estágio inicial da doença — com no máximo sete dias de diagnóstico.

Estes pacientes pertenciam a três grupos: crianças com até cinco anos de idade (46 pacientes); crianças com cinco a 17 anos de idade (51 pacientes); e adultos com 18 a 65 anos (48 pacientes).

As amostras do primeiro grupo, das crianças mais novas, tiveram menor valores CT para PCR — uma medida técnica que indica os ciclos necessários para detecção de fragmentos do vírus. Ou seja, quanto menos ciclos para encontrar o material, isto é um indicativo de uma carga viral maior.

O valor CT mediano foi semelhante para crianças mais velhas (11.1) e adultos (11.0), mas significativamente mais baixo para crianças mais novas (6.5).

“Para tentar remover variáveis que pudessem causar confusão ou parcialidade, foram excluídos os pacientes que estavam mais doentes (precisando de suporte de oxigênio); que estavam assintomáticos; ou que tinham duração dos sintomas desconhecida ou maior que uma semana”, escreveu à BBC News Brasil Taylor Heald-Sargent, médica e autora principal do estudo, do tipo research letter (“carta de pesquisa”, em tradução livre, uma espécie de relato mais conciso de um estudo).

“Nosso estudo não examinou diretamente a replicação viral ou a transmissão do SARS-CoV-2, mas foi demonstrado para outros vírus que quantidades mais altas do patógeno podem aumentar a capacidade de transmissão. Isto aliado ao fato de que crianças pequenas são menos propensas a usar máscaras de forma consistente, manter boa higiene das mãos e evitar tocar a boca ou nariz, parece lógico (supor) que as crianças sejam capazes de transmitir o vírus a outras pessoas”, afirmou Heald-Sargent.

A publicação destaca que “conforme sistemas de saúde planejam a reabertura de creches e escolas, entender o potencial de transmissão das crianças será um guia importante para medidas públicas de saúde”, assim como para o planejamento de quais serão os públicos etários prioritários de uma eventual vacina, acrescentam os autores.

O valor CT mediano foi semelhante para crianças mais velhas (11.1) e adultos (11.0), mas significativamente mais baixo para crianças mais novas (6.5).

Otsuka aponta que há sinais de que crianças menores do que um ano podem apresentar maiores vulnerabilidades à covid-19 por conta de um sistema de defesa ainda em formação, conforme ele e colegas têm observado no Hospital Infantil Darcy Vargas, em São Paulo — aspectos clínicos registrados ali foram inclusive disponibilizados recentemente na plataforma de pré-publicação (sem revisão dos pares), medRxiv.

Presidente do departamento de infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Marco Aurélio Sáfadi também destaca que “muitas vezes o RNA reflete um vírus que não é viável para infecção”, sugerindo cautela com os resultados obtidos via PCR. Ele também aponta que não se pode ignorar os vários estudos que vêm minimizando a função das crianças como vetores da covid-19.

“Quando você vai para o mundo real, os estudos que tentam investigar o papel das crianças na transmissão são praticamente unânimes em destacar que crianças (abaixo de 10 anos) têm desempenhado um papel menos relevante na transmissão. Eles mostram que obviamente as crianças podem transmitir, mas são os adultos jovens os principais vetores de transmissão”, diz Sáfadi, professor de infectologia e pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

Publicado no início do mês na revista científica Pediatrics, um destes estudos mostrou, a partir do de um rastreamento feito pelo Hospital Universitário de Genebra com 111 adultos que tinham tido contato com crianças infectadas, que apenas em 8% dos casos, a criança desenvolveu sintomas primeiro — ou seja, possivelmente tendo sido a origem da cadeia de transmissão. Grande parte dos casos foram de ciclos iniciados com adultos manifestando sintomas.

O médico destaca ainda o conhecimento que se tem sobre crianças e a transmissão de outras doenças — e que pode também ajudar com pistas sobre o que acontece na covid-19.

“Para a influenza, as crianças são claramente vetores de transmissão importantes na comunidade. O próprio vírus que causa a bronquiolite, também”, diz, se referindo neste caso ao vírus sincicial respiratório (VSR), também citado pelos autores do JAMA Pediatrics como um histórico importante a se considerar.

“Por outro lado, outros coronavírus, como os da Sars (síndrome respiratória aguda grave) e Mers (síndrome respiratória por coronavírus do Oriente Médio, na sigla em inglês), não tiveram nas crianças uma fonte importante de transmissão. Então, este também pode ser um comportamento de classe dos coronavírus.”

Fonte: BBC News Brasil



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