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Diário da Amazônia

“Falta mão de obra para reconstruir Notre-Dame”

Presidente da Associação dos Construtores de Catedrais Europeus, Wolfgang Zehetner, afirma que faltam profissionais especializados

Por Deutsche Welle
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Publicado: 18/04/2019 às 10h01min

Presidente da Associação dos Construtores de Catedrais Europeus, Wolfgang Zehetner, afirma que faltam profissionais especializados para trabalhar na reforma da catedral parisiense atingida por incêndio. Wolfgang Zehetner é mestre em construção de catedrais da Catedral de Santo Estêvão, em Viena, e presidente da Associação de Mestres Construtores de Catedral Europeus. A associação foi fundada em 1975 e hoje tem 150 membros em 17 países europeus.

Ruínas no interior da Catedral de Notre-Dame após o incêndio

Em entrevista à DW, o especialista afirma que o principal desafio para a reconstrução da Catedral de Notre-Dame será encontrar trabalhadores para atuar na obra. Ele diz ser limitada a oferta de profissionais especializados no setor.

“As pessoas não estão mais familiarizadas com a arte com que o cinzel extrai detalhes da pedra, porque hoje se trabalha principalmente com pedras manufaturadas industrialmente”, explica.

Deutsche Welle: As promessas de doação para a reconstrução da Catedral Notre-Dame de Paris atingiram a marca de 1 bilhão de euros, somente dois dias após o incêndio. O senhor diz que o problema não é o dinheiro, mas a falta de profissionais especializados. Por quê?

Wolfgang Zehetner: Profissionais capazes de trabalhar com delicadeza e experiência nessas antigas esculturas de pedra e ornamentações arquitetônicas não estão mais disponíveis em grandes quantidades na Europa. Será um desafio obter qualificações correspondentes em tão pouco tempo.

Os especialistas existentes já trabalham em outras igrejas?

Sim. Há trabalhadores qualificados nas grandes oficinas especializadas na Alemanha e em outros países. A mais famosa fica em Colônia. Em Viena, na Catedral de Santo Estêvão, temos 20 funcionários permanentes trabalhando na restauração. Mas essas oficinas são como as últimas aldeias gaulesas. Na vida cotidiana da indústria de construção civil atual, este ofício já não está mais disponível. As pessoas não estão mais familiarizadas com a arte com que o cinzel extrai detalhes da pedra, porque hoje se trabalha principalmente com pedras manufaturadas industrialmente.

De onde poderiam vir os profissionais que agora são necessários em Paris?

Nós, da direção da Associação Europeia de Construtores de Catedral, concordamos que, se for desejado na França, podemos enviar especialistas de oficinas individuais. É claro que não podemos esvaziar oficinas existentes que já estejam cheias de trabalho. Há certamente também pessoas qualificadas na França. Mas se todos foram levados para Paris, então há o risco de que outras estruturas careçam dos cuidados e apoio necessários. No geral, há uma escassez de profissionais qualificados no setor de pedra e de restauração.

Aprendizes são treinados diretamente nessas oficinas de construção de catedrais?

Sim, essencialmente. Há também aprendizes que aprendem do zero. Mas, via de regra, entalhadores já formados são treinados nas oficinas para trabalharem especialmente em edifícios medievais.

A Associação Europeia de Construtores de Catedral tem membros de 17 países. Seu site, dombaumeisterev.de, mostra em um mapa da Europa, todas as catedrais pertencentes à associação. Da França, apenas a Catedral de Estrasburgo está nela. E a Notre-Dame de Paris e todas as outras catedrais francesas?

A Catedral de Estrasburgo é uma exceção. Na França, as principais catedrais são nacionalizadas e administradas por um ministério. Ao contrário da Europa Central e da Inglaterra, não existe essa estrutura de oficinas de construção locais.

O presidente francês, Emmanuel Macron, prometeu reconstruir a Notre-Dame dentro de cinco anos. Por outro lado, Frédéric Letoffé, presidente da associação de empreiteiros franceses para edifícios históricos, acredita que um prazo de dez a 15 anos seja mais realista. O que o senhor acha?

Acho que a meta de Macron é muito ambiciosa. Será difícil cumprir esse prazo. Ao mesmo tempo, estou feliz por essa proposta. Faz com que o próprio presidente, que é o representante supremo do proprietário, assuma a responsabilidade para mobilizar os meios apropriados. Se a forte empatia pela Notre-Dame persistir e a respectiva vontade estiver presente, posso até imaginar que o trabalho mais essencial esteja concluído mesmo a ponto de a Notre-Dame poder ser utilizada novamente como igreja e como monumento dentro de cinco anos.

O senhor espera más notícias nos próximos dias, por exemplo, de que as pedras da catedral estão mais danificadas do que se temia?

Espero que não. A própria pedra não queima, mas pode perder sua capacidade de carga devido ao calor. Particularmente afetadas são as áreas nas torres que se conectam ao teto. Nós conhecemos o problema também do incêndio na Catedral de Viena de 1945. A pedra, então, não é capaz de suportar carga como antes. Esta é a análise mais importante agora, para saber que pontos devem ser reforçados ou mesmo substituídos para garantir a estabilidade da construção a longo prazo.

O teto da Notre-Dame também era chamado de “a floresta”, porque consistia de velhos e longos troncos de árvore. Alguns dizem que não há árvores suficientes desse tamanho para reconstruir fielmente o telhado.

Receio que esta afirmação esteja correta, pelo menos para a Europa Central. E se alguém tem a pretensão, na preservação de monumentos, de permanecer tão fiel ao original quanto possível, então é claro que surge a questão sobre se deve ser cogitado trazer madeira das florestas tropicais brasileiras.

Usar uma impressora 3D provavelmente não é uma opção para preservacionistas?

Tecnicamente, você certamente pode fazer muito hoje. Mas mesmo que o Castelo da Cinderela na Disney pareça o Castelo de Neuschwanstein, na Baviera, ele continua não sendo o Neuschwanstein.



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