Nove famílias que vivem no ramal São Sebastião, na comunidade Boa Fé, situada à margem esquerda do rio Madeira, estão apavorados com a possibilidade de serem retirados de suas casas. Segundo os moradores, a área foi cedida há 28 anos pelo proprietário da terra. Acontece que em 2008, o dono do local faleceu e os seus filhos passaram a reivindicar a área alegando expansão da atividade agropecuária.
Desde 2010 os herdeiros da terra começaram a cobrar o direito sobre a terra. Este ano em decorrência da cheia histórica do rio Madeira, as famílias foram para abrigos, pois toda a área ficou alagada. Ao retornarem para suas casas receberam uma intimação de reintegração de posse.
De acordo com a Lei nº 6969/81, todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano, possuir como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área rural contínua, não excedente de 25 hectares, e a houver tornado a área produtiva, tem direito de requerer na Justiça o domínio do lote.
No entanto, a SPU (Superintendência do Patrimônio da União), afirma que a área pertence a União, e que a preferência é das famílias que ali residem.
O problema agora são os prazos, relatou dona Maria da Conceição Nunes, aposentada e moradora da área requerida. Ela conta que a SPU encaminhou um documento de anulação do processo de reintegração de posse, à AGU (Advocacia-Geral da União), mas que até o momento, eles não recorreram da sentença, o que preocupa dona Maria.
“Nós vivemos aqui há 28 anos, meus filhos cresceram aqui, o mais novo nasceu nesse lugar, eu tenho 24 netos, 9 filhos e todos casados, somos num total de 43 pessoas nesta terra. Não temos pra onde ir”, declarou.
Sentença justicial
O processo foi julgado no Fórum Cível pela juíza Ursula Gonçalves, que mesmo com o documento da SPU que afirma que a área é da União e não de propriedade particular, deu parecer favorável aos “proprietários”.
Agricultura familiar
A família viveu durante todos esses anos da agricultura familiar, metade era pra sustento da família e outra parte pra venda. No local, antes da cheia do Madeira, era cultivado macaxeira, para a produção de farinha, biribá, açaí, manga dentre outros. “Chegávamos a tirar 50 litros de açaí por semana. Depois da enchente perdemos tudo, eu sou aposentada e ganho pouco, meus filhos estão recebendo auxílio aluguel que usamos pra comprar mantimentos. Meus filhos plantaram macaxeira após a cheia, só que nada vingou, foi preciso eles conseguirem emprego na cidade pra poder viver, uns trabalham com vendas, outros na usina, e assim vamos vivendo”, frisou.
Mais prejuízos
Além do problema com o cultivo da produção, uma das casas ficou soterrada, outra foi destruída pela força das águas. A estrada ficou comprometida, com vários atoleiros, com isso, os ônibus escolares não entram mais no ramal. “As crianças vão e voltam da escola a pé, a escola fica muito longe, o caminho é perigoso, tem a BR-319, e tudo isso nos deixa preocupados, até porque não é sempre que podemos ir levar e buscá-los na escola”, relata.
Contudo, a única coisa que dona Maria da Conceição e seus familiares querem é o direito de permanecerem em suas casas, plantar, colher, criar seus netos, no local onde passou praticamente toda a sua vida.
“Terça-feira (21) acaba o nosso prazo, é quando precisaremos sair, pois eles virão com polícia, tratores e tudo pra derrubar nossas casas e tomar posse da terra. Se não houver nenhuma ação por parte da AGU até o meio-dia da segunda-feira (20) seremos expulsos. E o que vai ser da nossa família?”, desabafou.