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Diário da Amazônia

Rondônia comemora 50 anos de Imigração Pomerana

A Europa vivia uma grande crise nos meados do Século XIX. A Revolução Industrial chega aos campos do seu continente. A mão de obra na..

Por Diário da Amazônia
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Publicado: 27/03/2019 às 11h56min

A Europa vivia uma grande crise nos meados do Século XIX. A Revolução Industrial chega aos campos do seu continente. A mão de obra na agricultura e pecuária é substituída pela máquina. A agricultura familiar passa a ter grandes dificuldades para sobreviver. O latifúndio cresce. Não resta alternativa aos agricultores familiares migrar para o Brasil, Estados Unidos ou Austrália.

A Pomerânia era uma das 39 províncias da então Confederação Germânica que se unificaria em 1871 transformando-se na Alemanha atual. A Unificação da Alemanha significaria buscar uma mesma língua, escrita, cultura e politica econômica num grande processo de nacionalização.

Mas antes da unificação alemã, milhares de pomeranos na busca de novas terras que “jorravam leite e mel” emigraram para América e Austrália. No Brasil, a maioria pomerana veio para o estado do Espírito Santo em 1859. Então vieram ainda como pomeranos nativos. E aqui assim mantiveram sua identidade tradicional por 160 anos.

No Espírito Santo mantiveram essa sua identidade cultural através da língua, agricultura, pecuária, culinária, religiosidade, música, dança, arquitetura, entre outras manifestações típicas pomeranas durante 100 anos, distantes dos grandes centros políticos e econômicos. Aqui, isolados mantiveram por 160 anos suas tradições.

Depois de 100 anos no Espírito Santo com a crise na agricultura familiar durante a Ditadura Militar em 1969 com a erradicação do café e com a propaganda do Governo Federal de integração das novas áreas de colonização, esses agricultores buscam novas oportunidades na Região Amazônica, especialmente Rondônia. De 1969 a 1990 milhares de pomeranos saíram do norte do Estado para Rondônia. Estima-se em 40 mil capixabas do norte do Estado.

Espigão do Oeste foi o município que mais recebeu imigrantes pomeranos do Espírito Santo durante essas décadas. Vila Pavão foi o município capixaba que mais perdeu emigrantes para Rondônia, nessa época: 40% de sua população. Espigão do Oeste hoje é o município com quase 50% de sua população pomerana e por isso denominado “a Pomerânia Amazônica”.

O primeiro pau de arara saiu do Espírito Santo, da cidade de São Gabriel da Palha em junho de 1969 com as famílias Hollander e Braun. Acamparam no vilarejo de Pimenta Bueno, as margens do Rio Melgaço. Mas Martim Hollander com o seu irmão Artur e outro parente já tinha ido a Rondônia para trabalhar em serraria em 1967 a convite de gaúchos. Sem dinheiro para voltar ficaram trabalhando em serrarias por 10 meses. Seu pai Pedro Hollander foi a Rondônia para encontrar seus filhos e leva-los de volta. No Espírito Santo encantados com as lembranças de Rondônia onde o “carroço de milho era tão grande que uma galinha não conseguia engolir”, “dava arroz até no seco” e “tinha tanta terra sem dono”, um ano(1969) depois estavam na carroceria de um pau de arrara voltando para “terra prometida”. Pedro Hollander e Emilio Braun venderam suas poucas coisas. Alugaram dois caminhões e rumaram para o novo território estimulado pela politica do Governo federal de integração nacional. Ao todo, foram mais de 60 pessoas. Se da Europa ao Espirito Santo as viagens de navio duravam de um a dois meses agora das terras capixabas a Rondônia de pau de arara elas demoravam de 5 a 20 dias. As viagens enfrentavam problemas de legislação, era proibido o transporte em carrocerias, mas com propina conseguiam prosseguir. Muitas famílias quando não tinham mais dinheiro para corromper os policias doavam relógios, rádios, joias, entre outros pertences para continuar a viagem. Também tinha as péssimas condições das estradas e o famoso “areião” no Mato Grosso nas divisas dos municípios de Comodoro e Sapezal. Era uma espécie de “areia movediça” onde os caminhões atolavam e as vezes ficavam dias com famílias e crianças. Índios, assaltantes e animais ferozes eram outros problemas. Escurecia os adultos abaixavam as lonas e sob elas ficavam de armas em punho. Teve família que não passou fome porque contava com a solidariedade de outras. Parecia a travessia do povo de Deus a procura da Terra Prometida.

Finalmente as primeiras famílias, Hollander e Braun chegaram ao destino tão sonhado, Pimenta Bueno. Mas ainda tiveram que ficar acampados as margens do Rio Melgaço que era uma espécie de obstáculo natural para chegar ao então vilarejo de Espigão do Oeste. Depois mais alguns quilômetros ao encontro de 42 alqueires de terra, por família doada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária/INCRA. Os Hollanders e Brauns ficaram na beira do rio acampados em barracas com folhas de palmeiras. A Cecilia Braun conta que para ajudar a família foi trabalhar nesses dias numa pensão. Além do dinheiro que ganhava levava num saco plástico o resto de comida que sobrava nas mesas para alimentar seus irmãos acampados.

E no Espírito Santo, os vizinhos encantados com as histórias dos Hallander e Braun começam a espalhar a noticia no norte capixaba. De Vila Valério tem a história do imigrante Martino Tesch que em outubro de 1969 começa a transportar enumeras famílias do norte do Espírito Santo para Rondônia e em 1972muda-se com a família para Espigão do Oeste. Martino é hoje a principal figura histórica e cultural pomerana do Munícipio. Martino tem o melhor arquivo histórico desse processo de colonização de Rondônia. Tem na sua casa uma verdadeira biblioteca sobre essa história. Martino Tesch fará palestras e exposição sobre os 50 anos da imigração pomerana para Rondônia nas cidades mais pomeranas de Rondônia durante o mês de junho como forma de comemorar a data.

Vila Pavão, norte do Espírito Santo foi o município capixaba que mais perdeu gente para Rondônia: 40 % da sua população que na época era de 15 mil habitantes. Chegou a perder 6 mil habitantes, a maioria de descendência pomerana e agricultores familiares. Isso fez a gente escrever em 20110 o livro “Cidades Irmãs Pomeranas: Vila Pavão (ES) e Espigão do Oeste (RO)” e na oportunidade os dois prefeitos assinaram também uma lei com esse titulo. Essa lei propõe parecerias culturais e politicas umas vez que centenas de famílias têm parentes entre si. O lançamento da lei e do livro foi feito em Vila Pavão na festa Pomitafro com uma caravana do prefeito e vereadores de Espigão do Oeste e depois na Festa Pomerana em Espigão do Oeste também com o prefeito e vereadores de Vila Pavão. Os moradores destas cidades se visitam constantemente. É comum hoje ter ônibus semanal do Norte do Espírito Santo para Rondônia e vice versa.

Espigão do Oeste é o município mais pomerano não só do Estado de Rondônia, mas de toda região Amazônica. Batizada de a “Pomerânia da Amazônica”. A maioria dos imigrantes ainda mantem diversas manifestações típicas desse povo que é um dos mais tradicionais do Brasil. Podemos citar manifestações com a língua nativa pomerana, a culinária (em Espigão com destaque para um pão típico: o brote), a música ( destaque para tradicional concertina) , a dança( Espigão tem um grupo de danças folclóricas), a arquitetura, a agricultura familiar, a religiosidade, os ritos do casamento, entre outros e é realizado todos os anos a já tradicional Festa Pomerana onde podemos presenciar essas manifestações culturais.

Se Espigão do Oeste (RO) elegeu só um prefeito de descendência pomerana Arlindo Dettmann(que é irmão do atual prefeito de Itaguaçu(ES),Darly Dettmann) até hoje , Vila Pavão e Santa Maria foram os únicos a elegeram todos seus prefeitos pomeranos. A Câmara de Vereadores de ambas as legislaturas sempre conseguiram eleger de 3 (Espigão do Oeste), 5 (Vila Pavão) e 8 (Santa Maria de Jetibá) em media pomeranos. A participação politica torna-se importante nas conquistas de politicas publicas voltadas à cultura pomerana.

A Imigração Germânica no Brasil tem um fato cultural interessante que aparentemente parece pejorativo, mas na verdade acaba fazendo parte da sua identidade na culinária: no Rio Grande do Sul esse imigrante germânico é denominado de “alemão batata”, no Espírito Santo de “alemão broteiro” e em Rondônia “alemão taioba”. Assim como outros grupos étnicos que tem a sua imagem denegrida usam isso justamente para provocar o contrário, ou seja, ter o orgulho, e usar isso em camisetas: alemão taioba, batata ou broteiro.

A Comemoração dos 50 anos de imigração, este ano terá sua programação mais abastada no município de Espigão do Oeste por fatos já citados. A Festa Pomerana terá antes palestras destacando essa colonização a sua importância na economia, na história local e nas manifestações típicas com a presença de autoridades locais, estaduais e federais.

 

Por: Jorge Kuster Jacob 



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