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Diário da Amazônia

Simone Norberto sobre a produção audiovisual

A jornalista e documentarista fala sobre a produção audiovisual em Rondônia

Por Jaylson Vasconcelos Diário da Amazônia
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Publicado: 06/08/2017 às 05h30min | Atualizado 17/09/2018 às 10h16min

Simone Norberto é jornalista, assessora e produz audiovisual, mora em Porto Velho desde os 4 anos de idade, graduada em jornalismo, trabalhou na televisão por 14 anos como repórter, mas desde muito cedo o que mais a encantava eram as artes, principalmente o cinema. Simone lembra que quando era criança e ainda morava no interior, ficava a noite acordada para assistir os filmes que passava na televisão. E anos mais tarde foi a sua experiência com o jornalismo de televisão que lhe possibilitou entrar em contato com a linguagem do audiovisual, uma forma que molda o seu trabalho até hoje.

“O audiovisual é uma ferramenta muito poderosa, para impactar, fazer refletir e para as pessoas mudarem, pois você adentra aquele universo, participa dos problemas que surgem e amplia sua percepção e empatia”.

Simone fez teatro, aulas de dança e sempre gostou de literatura, da sua vivência na prática jornalística e, do que vivenciou na experiência nas artes o aspecto social é algo muito presente em seus trabalhos, dar voz aos personagens que são silenciados, abordar os diferentes lados de uma situação, e ter a sensibilidade de mesmo com toda sua bagagem cultural se permitir colocar no lugar do outro, faz da sua obra um espelho de constante reflexão.

Algumas referências que fazem parte do seu trabalho foram se construindo com o passar do tempo, ela explica que o documentário sobre a hidrelétrica de Balbina no Amazonas, que com sua construção prejudicou as comunidades indígenas que ali estavam inseridas, foi uma forte inspiração no sentido de voltar o olhar de uma forma mais crítica para as questões locais.
Simone já participou de diversos festivais, dentre eles o festival de cinema de Manaus, com o bem-sucedido documentário Bizarrus (2010), que ganhou prêmio e circulou por toda a região norte. O documentário conta a trajetória de um grupo de teatro formado dentro do presídio Ênio Pinheiro, e aborda a questão da ressocialização por meio da arte.

“Fiquei satisfeita com este trabalho, pois acompanhei desde o começo a formação do grupo de teatro, na época que ainda era repórter, então quando fui fazer o documentário, já tinha uma sensibilidade maior para retratar cada situação”.

Além dos documentários, Simone produz filmes experimentais, Repositório foi um destacado entre eles, que também foi premiado como melhor vídeo experimental, a obra é um recorte de um poema do Manoel de Barros, onde ela usa como analogia poética um lixão da capital.

Incentivo à produção do audiovisual em Rondônia

Os investimentos do Governo para o audiovisual no Estado é praticamente inexistente. Segundo Simone, os investimentos ficaram estagnados desde 1996, os produtores precisavam recorrer para outros ambientes, produzir sozinhos ou com o apoio uns dos outros. Este ano foi lançado apenas um edital, como política de fomento para a produção do audiovisual, depois de 21 anos. Neste meio tempo existiu o projeto do Doc TV, para a produção de documentários locais exclusivos para a televisão, mas ficou paralisada por falta de recursos do Estado, Simone explica como era feito o processo de captação de recursos:

“Durante o governo Lula e Dilma existia o fomento para a produção nacional, então a gente se inscrevia nos editais nacionais mesmo, tentando disputar com profissionais de todo o Brasil. Alguns colegas conseguiram realizar seus projetos com o apoio da Petrobras. Produções nacionais neste meio tempo aconteceram, mas foram muito raras, aqui em Rondônia nunca teve uma política de edital, precisamos fazer disso uma prática recorrente, o Estado começa a se conscientizar agora, enquanto outros lugares como Pernambuco já existe uma política institucionalizada de cinema há muito tempo, é preciso garantir estas políticas e recursos para que aconteçam estes editais e movimente o cenário dos filmes locais”.

Cine Oca – Cinema democrático e direitos humanos

O Cine Oca é um lugar para a difusão de filmes locais e nacionais que estão fora do circuito, é uma forma das pessoas conhecerem as obras produzidas na região. Simone também é diretora do Cine Oca e, discutir os temas locais é de suma importância, pois o espaço serve de ponte para a identificação, possibilitando a discussão de problemas.

O cineclube possui uma grade de exibição mensal, além de incentivar o encontro e o diálogo através das obras audiovisuais. Em maio deste ano o Cine Oca produziu a 11ª Mostra de Cinema e Direitos Humanos que foi realizada pelo Ministério dos Direitos Humanos e Icem, com patrocínio do Itaú Unibanco e Petrobras, o tema foi pautado na discussão de gênero, sobre o engajamento e os resultados que a mostra alcançou Simone diz:

“Este ano, a questão LGBT foi essencial, pois tem gente ainda com um conservadorismo incrível de homofobia e transfobia, chegando a cometer crimes hediondos contra as travestis, esta é uma questão muito delicada e séria, um problema social que precisa ser discutido. Na mostra trouxemos filmes que debatem estas questões, para assim trazer uma maior reflexão, só assim podemos mudar esta visão arcaica que ainda existe. As crianças que participaram aceitaram tão bem, teve um filme que debateu com muito bom humor a questão dos transgêneros, onde o pai ficou ausente por 4 anos do filho, e quando voltou tinha se tornado uma mulher, e a criança aceitou, falando que agora tinha um pai e uma mãe, é desse jeito que podemos mudar as coisas, educando as crianças para enxergar que isso é normal, este ano a mostra deu menos gente, comparada as outras edições, mas é compreensível, em um estado composto em sua maioria por religiosos, falar sobre estas questões é impenetrável nas suas convicções engessadas e olhos cristalizados”.

Simone agora produz um filme sobre a comunidade ribeirinha de Nazaré, que vai se chamar Nazaré Encantada e foi tema do seu mestrado, onde são analisados os mitos ribeirinhos na perspectiva pós-colonialista. O filme vai ser baseado em como estes mitos são importantes para a vida cotidiana desta comunidade, ainda não tem data de estreia, mas a previsão é que seja lançado ainda este ano.



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