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Diário da Amazônia

Especialistas avaliam causas da abstenção

Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que nas últimas eleições presidenciais brasileiras, em 2010, a abstenção eleitoral..

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Publicado: 03/10/2014 às 13h05min | Atualizado 29/04/2015 às 01h59min

Nas eleições gerais de 2010, o número de eleitores faltosos superou o de 1998

Nas eleições gerais de 2010, o número de eleitores faltosos superou o de 1998

Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que nas últimas eleições presidenciais brasileiras, em 2010, a abstenção eleitoral cresceu pela primeira vez, desde 1998. A taxa de 18,12% foi inferior à média registrada nos últimos 16 anos (18,53%), mas quebrou a tendência de comparecimento eleitoral crescente que o Brasil vinha experimentando nas décadas anteriores.
Para especialistas, porém, esse número não é motivo de preocupação. Segundo Manoel Leonardo Santos, professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), uma abstenção de até 20% não chega a ser sinal de problemas em uma democracia.
“A política não interessa a todo mundo mesmo, não. Isso é natural. Mesmo em democracias altamente consolidadas a participação não é total”, disse.
Santos acredita que o País passa por um momento de afastamento dos cidadãos em relação à política, o que teria culminado nas manifestações de rua de junho de 2013.

“Tivemos um evento incomum, onde um forte sentimento antipolítica foi repercutido. As pessoas reagem a isso. Acho que esse é um problema residual. A partir do momento em que o debate vá se aprofundando, as pessoas se envolvem mais”, acredita.
De acordo com Acir Almeida, técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), essa tendência de distanciamento dos eleitores foi registrada em diferentes países em tempos recentes.
“O engajamento das pessoas tem aparentado declínio mesmo nas democracias mais consolidadas. É um padrão internacional, mas ainda não há explicação consolidada para isso”, observou.

O PORQUÊ

Os motivos que levam o eleitor a não votar são tão desconhecidos para estudiosos da Ciência Política quanto os que o impulsionam às urnas. “As razões que movem o eleitor são uma esfinge. Por que as pessoas votam quando sabem que sua possibilidade de influenciar o resultado é ínfima? Votam por algum sentimento de pertença, ou porque acham importante a democracia, e uns votam só porque é obrigatório”, avaliou Santos.
A obrigatoriedade do voto é apontada como o principal motor da participação eleitoral no Brasil. Almeida, porém, não acredita que ela conte a história toda. “Voto obrigatório significa comparecimento obrigatório. Se você vai pensar no seu voto é outra história. É importante ter essa distinção em mente”, salientou o pesquisador do Ipea.
Um fator de peso que ainda restringe a dimensão da participação eleitoral no Brasil, segundo Almeida, é o estabelecimento ainda recente de eleições regulares e abertas no País. “O que falta, no caso brasileiro, é tempo. Nossa experiência democrática ainda é recente, e a constituição de laços fortes [dos partidos] com o eleitor demanda tempo. Esperar que tenhamos o mesmo grau de politização de eleitores europeus, por exemplo, não faz muito sentido”. (Agência Senado)

Fatores que contribuem com a ausência do eleitor

Almeida enumerou uma série de fatores que se juntam para manter o eleitor em casa no domingo de eleição, como as características das regras eleitorais, educação, aspectos socioeconômicos. “No Brasil, temos diferenças regionais muito grandes e é natural que haja taxas diferenciadas por causa dessas diferenças. Isso tirando as variáveis de natureza político-eleitoral”.
As diferenças regionais geram um fenômeno que o professor Manoel Leonardo Santos classifica como grave: os índices de abstenção são maiores nas regiões mais carentes do País, onde os eleitores têm menor renda, pior nível educacional e menos acesso à informação.
Essa análise é corroborada pelos dados. Dos 10 estados com maior média de abstenção eleitoral entre 1994 — primeiro ano disponível na série histórica do TSE — e 2010, sete aparecem entre os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, segundo o estudo mais recente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). “Quem menos participa são aqueles que mais precisam participar. A falta de envolvimento político de setores menos favorecidos da sociedade acaba reproduzindo as desigualdades e deixando essas pessoas de fora do processo”, alertou.

OBRIGATÓRIO

O Brasil é um dos 22 países no mundo em que o voto é obrigatório. A enorme variação das taxas de abstenção entre essas nações, entretanto, indica que fazer da participação eleitoral um dever não é garantia de presença maciça ou de afastamento político.
A taxa brasileira de 18,12% de ausentes está bem abaixo da média desses 22 países se consideradas apenas as eleições mais recentes em cada um deles: 25,09%. A média apenas dos países latino-americanos também supera a estatística brasileira: 25,01%. Incluem-se aí, além do Brasil, Bolívia, Uruguai, Peru, Equador, Argentina, Panamá, Costa Rica, Paraguai, México, Honduras e República Dominicana.

Os extremos dessa lista de 22 mostram as diferenças possíveis dentro de sistemas eleitorais semelhantes. Países como Bolívia, Austrália, Cingapura e Luxemburgo não chegaram a 10% de abstenção em seus últimos pleitos. Por outro lado, as taxas chegaram a ultrapassar a casa dos 30% (Grécia, México), 40% (República Dominicana) ou mesmo 50% (Tailândia).

Os especialistas consultados veem o Brasil num bom patamar de participação política. “O eleitorado brasileiro é politizado, sim. Boa parte da população se entusiasma na época de eleição”, considera Acir Almeida, enquanto Manoel Santos completa que “há uma multiplicidade de ideias e de representação política Brasil afora, e espaço para a discussão de temas variados”.



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