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Diário da Amazônia

Preço do diesel vai ser o primeiro grande desafio de Bolsonaro

Segundo estudo, depois do combustível vem reforma da previdência, política do mínimo, regra de ouro e teto de gastos

Por R7
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Publicado: 05/11/2018 às 14h33min | Atualizado 05/11/2018 às 14h34min

Imagem da greve dos caminhoneiros em maio deste ano

Um estudo da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal que faz estudos econômicos, aponta que o primeiro desafio econômico do próximo governo será a decisão sobre a política de subvenção ao diesel, assinada por Michel Temer para por fim à greve dos caminhoneiros deste ano.

A subvenção acaba em 31 de dezembro de 2018 e o novo presidente precisa definir, antes de assumir em 1º de janeiro, se o benefício será postergado, em acordo com os caminhoneiros, tendo em vista o risco de uma eventual paralisação em início de governo. O custo estimado para o subsídio para o ano que vem é de até R$ 20 bilhões, o que compromete o cumprimento do teto de gastos. O diretor da IFI Gabriel Leal de Barros conversou com a Coluna e explica:

— O próximo governo vai herdar situação muito ruim e há coisas que ele vai precisar resolver antes de sentar na cadeira. E a primeira é o diesel. Se mantém ou não a subvenção, que está orçada entre julho a dezembro em R$ 9,5 bilhões, mas deve fechar em R$ 6 bi em função do câmbio. Mas mesmo que seja R$ 6 bi, a projeção para o ano que vem, caso seja mantida, são R$ 12 bilhões, que é muito dinheiro. Corresponde a 40% do programa Bolsa Família. Mas isso seria o piso. Porque pode chegar a R$ 19 bilhões para o ano que vem.

Além do alto valor, ao contrário do que acontece esse ano, a subevenção teriam que em 2019 estar dentro da meta do teto de gastos do governo, o que compromete o orçamento já apertado do governo federal.

— O problema adicional é que esse ano a despesa da subvenção está fora do teto de gastos, porque é crédito extraordinário. Só que ano que vem isso não pode ser feito, tem que estar dentro do teto, pressionando o teto que já está apertado em função da não reforma da Previdência.

Outro motivo, de acordo com o estudo, que coloca a questão do diesel como problema número um a ser resolvido é a sinalização em relação à política fiscal do novo governo.

— Essa primeira decisão vai sinalizar como será o equilibrio fiscal das contas públicas, se ele será mais rápido ou mais devagar. E isso vai fazer uma grande diferença para os agentes econômicos. Tecnicamente não tem como manter essa subvenção, mas há uma questão política a ser resolvida. Se o presidente não renovar a subvenção o preço sobe, mas se ele renovar a piora nas contas é tamanha que vai afetar a percepção dos agentes econômicos na largada do governo e pode ter uma deterioração da percepção dos agentes de mercado em torno da condução da política fiscal.

Os outros desafios econômicos que precisarão ser resolvidos com urgência pelo novo presidente, de acordo com o estudo são, nessa ordem: reforma da previdência, política de reajuste do salário mínimo, regra de ouro (de endividamento) e o teto de gastos. A avaliação do instituto é que o governo tem tantos desafios econômicos interconectados, que precisa agir rápido sem cometer nenhum erro. “A janela de oportunidade é pequena e estamos vendo ainda a piora do cenário internacional”, diz Leal de Barros. Para ele, a solução que costuraria todos os problemas prioritários da agenda econômica seria fazer um grande plano, que seria “o plano Real do problema fiscal”.

— Precisamos fazer “um plano real para as contas públicas”, o tamanho do desafio é esse. Um plano real para resolver o fiscal, não é desafio só quantitativo, de sair de um déficit de dois pontos para um superávit de dois pontos. Além disso há um problema de regras, de como elas se comunicam. Temos um problema no arcabouço fiscal, de desenho das regras fiscais que precisam ser aprimoradas.

Veja abaixo, em pontos, o que o instituto pensa separadamente de cada desafio econômico de Bolsonaro, além da política de preços de diesel.

Reforma da Previdência

— O ideal é que seja aprovada ainda esse ano alguma coisa da proposta que está na Câmara. Ao que tudo indica a proposta do novo governo será outra, com capitalização, e nesse caso a discussão começa do zero. Então era importante aprovar algo da repartição, idade mínima, alguma transição, ainda esse ano. E em 2019 usa-se o capital político para a discussão da capitalização. A nova proposta demora, e se começar do zero a discussão é lenta, a nova legislatura começa apenas em fevereiro, tem que formar comissões, o processo é lento.

Se demorar muito, entra no problema da lua de mel, esse é o primeiro desafio que envolve quórum constitucional. A discussão pode levar tempo, e não há tempo a perder. Outro problema é que o mercado internacional está mudando muito, com tendência de corte de juros pelo Banco Central americano o que tira dólares do mercado internacional e desvaloriza as moedas dos emergentes e emergentes que têm fundamentos macroecônomicos mais frágeis, como Argentina e Brasil, sofrem mais. Os países mais vulneráveis à subida de juros dos Estados Unidos,são a Argentina e o segundo é o Brasil.

Salário mínimo

— A regra atual só vale até 2019 [que dá aumento real ao mínimo]. Essa regra vai até 2019 e em 2019 o presidente eleito vai ter que resolver qual a regra a partir de 2020. Na opinião do instituto há dois pontos: não é consesual a ideia de que aumentar salário mínimo aumenta empregabilidade. Isso pode ser contraproducente.Existem pré-condições para que aumento do gasto do crescimento gere crescimento. Na prática há pré-condições.

A regra atual não dá para manter, do ponto de vista fiscal. Porque há várias despesas do governo indexadas ao salário mínimo e somos um dos poucos países do mundo que vincula do salário da ativa com o seguro da velhice [aposentadorias]. E essa vinculação do salário mínimo com aposentadorias impede que o governo faça de fato uma política de valorização do salário mínimo. Isso limita que o governo valorize o salário mínimo porque cria um buraco. A natureza da remuneração é diferente. A decisão da política do salário mínimo é tão importante porque 65% da Previdência é paga até um salário mínimo. O abono salarial, que é um décimo quatro salário que o governo paga, 100% está vinculado ao salário mínimo. O BPC [benefício de prestação continuada] também é 100% vinculado ao salário mínimo. Seguro desemprego, cerca de metade é pelo salário mínimo. Ao desvincular teria que ter uma discussão de qual será o valor sem a perda do poder de compra. Seria possível dar para o aposentado a perda de inflação. E para o salário mínimo dar a inflação e o ganho real. Então a decisão da política do salário mínimo impacta no tamanho da despesa obrigatória para os próximos anos. E como tudo está amarrado, o quanto aumentar despesa obrigatória ocupa mais ou menos o teto de gastos.

Regra de ouro

— A decisão do salário mínimo afeta qual será o fôlego para o teto de gastos. Que por sua vez, o pedaço que sobra terá que ser estrangulado para não violar o teto, que é o investimento. O investimento é importante para o cumprimento da regra de ouro: que diz que governo só pode se endividar para investir. Quanto menos ele investe, menos ele pode se endividar E se ele descumprir a regra de ouro, há crime de responsabilidade e que gera impeachment, ou seja, há um risco enorme. Porque há déficit da despesa corrente de 7% e por isso que tenho que me endividar mesmo que zere o investimento porque há déficit.

Em 2019 dá para cumprir a regra de hora, o problema são os próximos anos. É o tempo do mandato. Ainda quem 2019 dê para cumprir esse risco vai ficar no radar até o final do mandato. Há como não discutir e não ter risco de impeachment que é o que o presidente Temer fez para 2019, pedir para não cumprir a regra para o Congresso. Essa conta chega e continua aumentando dívida e presidente fica na mão do Congresso. É preciso que se tenha solução até para o mercado.

Teto de gastos

— É hoje a única âncora fiscal que o governo tem. Mexer ou acabar no teto de forma prematura é um erro. Vamos lembrar que a partir de 2008 na política anticiclica se reduziu a meta de superávit primário, mas se fez muito mais do que isso. O resultado que era em torno de 3% do PIB caiu muito. E começamos a aumentar as despesas que poderiam ser deduzidas da meta, antes só podia descontar o PPI que era pouca coisa, aí começou a colocar um pedaço do PAC, aumentou o volume de descontos, aí começou a colocar o subsídio do Minha Casa Minha Vida, depois todo o PAC e depois desonerações tributárias e a meta de resultado primário não servia mais para nada. A meta deixou de ser uma âncora e uma síntese da política fiscal e o tripé macroeconômico ficou capenga. E o resultado foi aumento dos juros. Porque gerou instabilidade. O teto veio para substituir isso e foi bem sucedido. Conseguiu ancorar e reduziu a curva de juros, em vários prazos. Isso é ganho porque a dívida podia estar pior, isso é ganho. O teto também traz expectativa de solvência da dívida pública e o efeito foi o custa da dívida ter caído. E outro mérito é definir prioridades. Mostra que o dinheiro é finito.



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